quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Suas roupas vestem bem?


Pergunto isso, pois a maioria das minhas roupas não veste, portanto, não as visto. Conclusão: não uso muitas roupas que tenho no armário. Das calças jeans aos vestidos, passando por saias e blusinhas. Mas porquê?!!! Por que a roupa do dia-a-dia sempre fica um pouco "tortinha"?!! Quando falo em roupa do dia-a-dia me refiro sempre a roupas consideradas "básicas" e de custo mais baixo. No onda do hi-lo, as roupas a que me refiro são as low prices e não as high prices, claro.

Há algum tempo atrás achava que o problema era o meu corpo. Não cheguei ao complexo, preferi relativizar. De uma maneira geral, observo que a roupa do dia-a-dia da brasileira que trabalha fora não veste bem. Por todo lado vejo blusas que não cobrem a barriga, mangas que não são confortáveis aos braços, calças com gavião torto, cofrinhos de fora, botões que ao aboatoarem deixam uma brecha na altura dos seios, saias fora do eixo da cintura/quadril ao se caminhar... e por aí vai. Isso sem falar nos estilos brasileiros não raros adotados para mostrar o corpo.

Quando fui à França fiquei chocada com a elegância natural das mulheres e homens. As roupas caiam perfeitamente bem em seus corpos. Dos bairros mais sofisticados de Paris aos de periferia, onde ficam os mercados das pulgas, passando pelo o interior do país, observei a existência de uma democracia do bom corte, do bom caimento e um gosto cultural dos franceses por isso. O design francês da alta-costura é normalmente caracterizado pela pureza da silhueta associada à complexidade do corte: o caimento que acompanha o contorno do corpo, com um quê de arredondado, pode ser observado por toda parte e isso independe do estilo da roupa que se usa.

Qual o real segredo do bom corte, do bom caimento, para além do gosto ou de um senso estético apurado que coordena bem os princípios e elementos do design como silhueta, linha, proporção, ritmo, equilibrio, harmonia, constraste...? Para mim a resposta é a matemática.

Em minhas andanças no último 1 ano e meio por cursos e ateliês que ensinam modelagem, corte e costura, aprendi que a responsável pelo bom corte é a modelagem. Esta é feita pela modelista que calcula, calcula, esquadra, compassa, mede, ajusta, soma, divide, subtrai, multiplica... Então, me arrisco a dizer que se modelagem é matemática pura e se os franceses são puramente cartesianos, sistemáticos e metódicos, o resultado não seria outro, senão uma modelagem impecável.

Quanto a nós... Bem, acho que de uma maneira geral não temos tanta afinidade com a matemática. Converso sempre que posso com costureiras que fazem moldes e a maioria os fazem de forma intuitiva. "É na fita métrica e no olho," dizem elas. Por vezes rejeitam até mesmo o uso de ferramentas de mensuração, pois aprenderam a modelar, cortar e costurar sem esses aparatos. Nos cursos que faço, vejo muitas meninas que não sabem usar a máquina de calcular e demonstram muita dificuldade com os esquadros.

Culturamente, parece que por aqui a matemática é um campo masculino. As mulheres não são estimuladas desde pequenas para a matemática e portanto, expressam mais dificuldade com essa ciência do que os homens. Isso não siginifica que temos menos capacidade, mas que essa capacidade não é usualmente desenvolvida.

Porém, somos muito criativas e encontramos sempre soluções ótimas na relação custo-beneficio. Por isso, as confecções e grifes de norte a sul do país descobriram e elegeram a viscolycra como solução para o nosso problema de caimento das roupas. Agora tudo é de viscolycra, viscoelastano, visco-seda-elastano-lycra, etc. As roupas desse material são fáceis de cortar e costurar e sempre dão um bom caimento, por mais simples ou "tosco" que seja seu corte.

Para pessoas como eu que não usam viscolycra nem sob tortura e adoram roupas de algodão, linho, poppeline e tricolline, é melhor correr para o curso de modelagem e se preparar para enfrentar a matemática. Tudo isso, como boas brasileiras, sem deixar de lado nossa intuição criativa!






quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Aos cientistas sociais...


“O efêmero incomoda, pois queremos coisas que durem, sólidas”. Mas, as coisas não duram e nos demos conta disso, o próprio conceito do luxo deixa de ser localizado pela posse de objetos (ostentação) e passa a ser cada vez mais um “luxo experencial”. O luxo do turismo cultural, de passear pelo jardim de Versalles, o luxo da degustação de vinhos e temperos. Um luxo que promove "uma experiência de eternidade com o tempo”. GILLES LIPOVETSKY (filósofo francês)
Ilustras: Victoria Ball e Petra DufKova

terça-feira, 18 de novembro de 2008

O Rio é mesmo Fashion?


Nessa inauguração escolhi um assunto que está na boca do povo da moda. Pelo menos estava até ontem a noite, quando pensei em escrever. Depois da agitada semana de moda "Claro Rio Summer Fashion", ficou a dúvida: Será que o Rio é mesmo Fashion com letra maiúscula?

Não que isso seja fundamental para mim, mas para o setor da moda brasileira é, e muito. Com potencial, a moda brasileira ainda não conseguiu alcançar o mercado internacional globalizado que gera bilhões e bilhões para os países membros desse circuito. Para piorar a situação brasileira, o Rio de Janeiro sempre tão cheio de "bossa" (expressão hoje muito utilizada pelo povo da moda) está perdendo seu posto para São Paulo, que tem hoje a melhor semana de moda.
Um indicador disso é a preferência de algumas grifes cariocas em desfilar no SP Fashion Week, alengando o maior número de clientes, contatos internacionais e, portanto, retorno financeiro. Realmente, São Paulo oferrece as melhores oportunidades para quem faz moda no Brasil. Em São Paulo estão o potencial produtivo e de criação. Um grande número de Universidades formam centenas de profissionais para todos os setores da moda e essa mão-de-obra é absorvida por lá mesmo.

Voltando ao Rio e ao evento, observei alguns sinais para responder a minha pergunta. Primeiro, achei curiosa a forma como a moda foi tratada como negócio nesse evento. Geralmente a imprensa trata a moda como fantasia, como um tema de comportamento da sociedade, mas não mostra o lado industrial. O Rio Summer foi, como dizem, "sexo explícito" se comparado com as semanas de moda de Rio e São Paulo. Quem estava lá sabe que só haviam estrangeiros, a língua oficial era o inglês e o interesse central girava em torno de preocupações com o mercado internacional.

Outra observação é sobre os clichês normalmente relacionados ao lifestyle carioca. Mas se não havia cariocas entre os participantes, o que houve foi a reprodução desse lifestyle, como mercadoria, sem nenhum pudor. Os convidados, todos grandes nomes internacionais, pareciam mais contratados do que convidados. Dessa forma, tudo foi parecendo muito artificial, muito produzido e fake, o oposto do tal lifestyle carioca, "cool, despojado e informal". Então, se o "Fashion" do Rio reflete essa tríade, ele não foi vista por lá.

Quem também não viu o Fashion por lá foi Scott Shuman, fotógrafo do blog The Sartorialist. Muito esperado pelas cariocas para que o lifestyle carioca fosse eternizado em seu blog, Shuman preteriu-as pelo exótico. Deve ser porque o street fashion do Hemisfério Norte tem influenciado demais por aqui... até hoje estão usando por aí o lenço palestino... Any way, Mr. Shuman preferiu registrar pombos, quioques de Copacapana, capoeira, crianças na praia e modelos internacionais às cariocas cheias de bossa. Nesse sentido, penso que talvez o Fashion do Rio esteja mais para o exótico, como é de praxe, do que para a tríade "cool, despojado e informal".

Parece que existe bastante dificuldade em agregar valor para as marcas nacionais a partir de uma identidade brasileira, isso em razão da diversidade que tal identidade abriga. Isso parece natural, em função da vastidão do nosso território e das pessoas e culturas que nele vivem. Insisti-se no duelo Rio X São Paulo, enquanto a roupa que está sendo produzida aqui é qualidade pura criativa e tecnologica em seus valores simbólico e de uso.

Eu adoro o Rio, não sou marxista, e acho o campo da moda e sua indústria fascinantes, assim como o frisson produzido para agitar a vida de pequenos burgueses, ou não. Por exemplo, sou fã da Cantão (a mais carioca e super industrial das grifes...) e de sua direitora de estilo, Yamê Reis. Fico encantada com as criações de Isabela Capeto (todas elas) e de Ronaldo Fraga. Sobre este, sua última coleção inspirada no Rio São Francisco é incrível. Se o Rio é Fashion ou não, isso continua sendo um problemão para a indústria da moda. Mas o que a indústria têxtil, os conglomerados, as grifes, os estilistas, os pilotistas, os modelistas e as costureiras estão produzindo está lindo, do ponto de vista de criação e do potencial econômico que oferecem ao País. Se essas relações são justas ou não, e se há democracia na moda brasileira, são assuntos para um próximo post.
*Ilustração: Hannah Firmin